24/11/09

"fotocópia"

de que são feitos os grãos
da areia que não se segura entre mãos?

19/11/09

"os que abraçam e os que dormem"

os que abraçam são poucos
e definham com receio dos que dormem

os que abraçam
acordam os que dormem
que podem não querer ser acordados

os que dormem
por vezes assustam tanto os que abraçam
que estes adormecem

os que dormem
por vezes não sabem que dormem

os que abraçam
por vezes não conseguem abraçar

há quem durma ao abraçar
e o corpo do abraçado responde habitualmente com uma náusea

há quem abrace meio mundo a dormir
sem que nunca ninguém saiba



18/11/09

"a ampulheta e o sonho"

já esqueci como.

recordo em intervalos
ar feito de alcatrão
delimitados em gaiolas
a interminável fome
o chilrrear sufocado

hoje abrem-se os braços
rodopia-se à chuva
ama-se na areia

amanhã
do outro lado da ampulheta
já nada existe
escoamos

assim somos iguais.

também eu
permaneço
preso dentro de mim


15/11/09

inadequado
divaga
deambula
vagueia

o galo não canta
os sinos não tocam
as sirenes iluminam em surdina
no parque das crianças só a ferrugem se faz ouvir
baniu-se o riso e a cor
o dicionário está mais leve que nunca
(em todo o seu insuportável peso)
a língua da nação-de-um

homem-ilha
inadequado

no final do dia regressa,
deixa-se morrer.

14/11/09

hesita antes de o dar...
o passo "correcto" não existe.
sabe-lo bem e hesitas.

na hesitação prolonga-se a hipótese de erro,
na cobardia que se refugia no medo.

de ti?
da rejeição?

rejeitemos então a mera hipótese evitando assim a rejeição.

no final do dia regressa,
deixa-se morrer.
chove!
e depois...
e depois?
tu não vens. eu não saio.
repete-se.
dois. dois. dois.

não interessa mais se o copo está meio vazio ou meio cheio.
partiu!
partiu e é tudo.
e no entanto teimam em colocá-lo de pé e enchê-lo.
o copo não joga mais.
ainda que quebrado opta pela transparência.
os estilhaços não atingem ninguém.
seguem separados o seu caminho.
já não há um todo. já não há livro.
as folhas deambulam pela calçada.
desbotadas.

chove. e depois?
todos os dias findam.
é a lei.

no final do dia regressa,
deixa-se morrer.

04/11/09

chega a mensagem
por pombo correio.
"anos de mentiras sustentam a tua lei.
alicerçaste a casa sobre areia movediça."
no final do dia regressa,
deixa-se morrer.