(Num dia sinto-me mais forte e no outro continuo a sonhar com burros, relações mortas, locais que já não são casa, projetos e trabalho de décadas que findou. Ainda não cabe em mim o tamanho da perda e a extensão da luta que aceito mas nunca pedi.)
"Let everything that's been planned come true. Let them believe. And let them have a laugh at their passions. Because what they call passion actually is not some emotional energy, but just the friction between their souls and the outside world. And most important, let them believe in themselves. Let them be helpless like children, because weakness is a great thing, and strength is nothing. (...) " de "Stalker" (Andrei Tarkovsky)
(Num dia sinto-me mais forte e no outro continuo a sonhar com burros, relações mortas, locais que já não são casa, projetos e trabalho de décadas que findou. Ainda não cabe em mim o tamanho da perda e a extensão da luta que aceito mas nunca pedi.)
“análise”
procuro
quem sonhe até à exaustão
e após repouso
acorde
para sonhar outra vez
não há culpa em quem
não se alongue:
em teoria deslumbra
na prática extenua.
a fragilidade dos menos atraentes dá bons romances
mas
não é tão bem tolerada.
sei de quem morreu de solidão;
escrevemos e
sentimos demais
contudo,
porque iria eu dizer
que me contento com a paixão
quando na verdade
quero enlouquecer até ao fim
dos nossos dias?
“sangue navajo, coração apache”
acordei com dois pés esquerdos
os sapatos apertam
tornam difícil andar em linha recta
fixo um objetivo
avanço com segurança
e quando parece próximo
os dois pés esquerdos
executam curva e contracurva
até que me encontre uma e outra vez
numa rua desconhecida
olho em redor
sento-me
peço um café
gargarejo
e cuspo-o no chão
peço a conta
desando,
descalço-me,
dispo-me,
prometo
rios de dinheiro
ao dono da lavandaria
em troco de uma toalha lavada
e pinturas de guerra
espero …
o uivo que rasga
com o dia a nascer
espero que o incêndio
não queime mais
que o peito que deseja arder
espero uma luta justa
que em mim
não me volte a aprisionar
espero um casaco de vento que agasalhe no frio
sem no calor sufocar
espero que ao procurar
te encontres
perto de mim
espero o enfarte do agiota
no banco de jardim
“Definição”
não esqueci. sei.
sorrio quando os olhos (te) encontram.
entre ser e estar espero ter quem me distinga. espero ser.
Nunca te perdeste e aí te alongaste? Que fazes ao teu medo enquanto esperas que os outros se libertem do deles?
sentir, agir, pensar, doença e luta.
espero ter
quem me distinga.
espero ser.
A chuva parece estática para quem não pára de correr Para asas pequenas que teimam não crescer inventam-se âncoras de medo.
O sonho chega em recorrentes ondas e impõe-se uma, outra e ainda outra vez.
Há algo que define mais que desespero, depressão e ansiedade.
Por mais recorrentes.
Por mais que "saturem".
Não há âncora que perdure:
Não sou o meu cansaço. Sou a persistência do sonho!
“espaço”
encaramos a luta nos olhos um do outro e aí nos perdemos
depois de uma década a aprender a viver na selva respira-se no intervalo fugimos para combater
encaramos a luta nos olhos um do outro e aí nos perdemos
um pelo outro
derrotado recorrentemente de recorrente força
este homem foi este homem não foi este homem é
este que engana à primeira vista aparente escapista manequim de montra este que se perde e reencontra de fraqueza enganadora e força que manifesta irregularmente homem de sonho recorrente arde sem se consumir na chama este que te ama como já não se ama.
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“até já” (para a Tânia, para o Bruno, para o Jorge e para o Félix)
demasiado cedo
tivesse eu mais braços
e mãos
e palavras
sempre demasiado cedo
tarde
para os braços que tardaram
as mãos que não se estenderam
e palavras certeiras.
a três compassos
da anestesia,
este peito
sente demais.
nestas minhas veias
corre algo
bem mais espesso que sangue.
“des-empatias”
uma pessoa constrói uma casa
para ser habitada por família
e surge sempre uma sacana
que vende as telhas do telhado
ao primeiro que passa
“santinho de altar”
perdidos em cúmplices sorrisos
fazemos o que podemos
ex-votos cardíacos
abençoados
em intervalos
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As ondam embatem com força. Naufragamos. Perdemos pessoas. Chegam desafios e receios. Queremos coisas. Tenho-te amor. Sonhamos demais. As ondas agigantam-se.
E depois o mar acalma.
Não me recordo de ele acalmar tão rápido exceto nos teus braços!
Agarro o leme com firmeza. O medo de perder uma força que reencontrei e é ainda muito frágil não se compara ao tamanho da minha coragem e da minha vontade.
Tenho-te amor e tenho-me amor. Será isso ?
Sendo ansioso por vezes é difícil saber o lugar entre 8 nem 80 na quantidade de coisas em que me encontro a refletir. Por vezes histórias que recordo recorrentemente. Que saturam. O importante será saber se causam dano ou se continuo a aprender e se tal aprendizagem me é útil.
A reflexão é antiga: Enquanto receavas ignoravas a mudança que já tinha começado. Num pedido de diálogo e procura de meios termos para vivências já não se conseguia ouvir nada ou lia-se mais carência e o precisar do outro. Já não era assim do meu lado mas agora compreendo melhor de onde isso veio: Pedi-te ajuda quando não te competia dar (e sim a mim ganhar forças), quando não a tinhas para dar e quando todo esse contexto tinha em ti ainda herança de coisas pesadas do teu casamento e já nossas (tal como eu tinha ainda uma insegurança brutal para lidar que herdei da relação anterior e a minha própria insegurança e desconforto com escola e pais e...)
Mais que não conseguires explicar porque não podias dar essa ajuda sei o teu desconforto dessa altura em Lisboa, o que leste no meu mal estar, o que ele te fez e o quanto ele marcou. Compreendo bem o diálogo viciado a que se chegou mesmo depois de eu começar a ter força em mim para o meu caminho. Viste-te novamente a ter de ser apoio de alguém que estava mal. Novamente a ter de dar demasiado de ti sem garantias que o outro também lutasse por si. Compreendo a marca que deixou ainda para mais trazendo tu já essa marca contigo quando nos conhecemos. Talvez essa compreensão e a minha aprendizagem me prolonguem este sentir.
Entre a coragem de algo novo, a descoberta de uma nova vida, as novas conversas, expressões, situações novas, o quebrar com a rotina, deixar de ouvir as histórias e vida que já conhecemos,... tudo o que ocorre ao iniciarmos nova relação e, no outro oposto, a coragem de reinventar a vida a dois quando se torna rotineira, marcada com todas as suas alegrias e desilusões e daí encontrar ânimo e paixão para novos desafios, será tão fácil dizer qual destas coragens está presa ao passado e qual dela está de olhos no futuro? Repetir o processo com alguém novo ou reinventar a relação? Não serão ambas repetir processos antigos na esperança de melhorar? Não serão ambas seguir em frente? Fará sequer sentido esse exercício de medir uma e outra? Compreendo ambas. Não deve nenhum lado ser julgado levianamente.
“segredos”
ambiciono sentir a urgência da vida sem o peso da urgência da vida
"Peter Pan" de Loisel
Uma re-interpretação do clássico. Bonita demais! 💓
" -...e também há mães?
- Mães? .. mas para quê?
- Bem, para te aquecerem o coração e para te contarem belas histórias."
"- (...) Ainda estou muito triste e às vezes passam-me coisas esquisitas pela cabeça... não percebo nada... já não sei se é sonho ou realidade mas, por vezes, não é nada bom, e parece que fica tudo vermelho... depois esqueço, já não sei de nada, já não me lembro de nada."
analógico é démodé.
as peças já não se fabricam.
faça-lhe o funeral
importe o novo modelo digital.
temos de mandar vir da Suíça.
vai custar um olho e um piparote!
Tem um problema
na engrenagem!
Tem um problema
na engrenagem!
Tem um problema
na engrenagem!
o material está obsoleto.
não cabe
na caixa
torácica.
“bússola”
força
e receio de a perder.
medo de ser soterrado
e laivos
para superar medos.
os dias oscilam.
um animal tenso fica cansado,
um animal cansado sente-se fraco,
um animal fraco sente medo.
os dias oscilam.
oscilariam
independentemente de tudo.
eu pirata de mim.
"pólvora, incenso e mirra"
Tão certo como as casas não terem língua materna.
Tão certo como as balas não terem causas.
do maior
ao mais pequeno
todos os nomes
desvanecem
fronteira
é mera mentira
de crianças.
um risco que separa os meus brinquedos dos teus,
a tua história da minha,
como se houvessem duas humanidades
causas e casos
enchem
noticiário
após noticiário
até à exaustão
já os corpos caídos pelo chão
são da terra
sem outra pátria que os reclame.
---"""---
“ode a um secador de cabelo”
“as coisas avariam nas minhas mãos
as jarras partem nas tuas”
outras frases se poderiam listar
que apesar de falsas se alongam
causando dano.
aprendi a rir-me
da anedota da vida.
“poeira”
quero um sonho em que não vacilo
para ao acordar
aprender
a não vacilar
um sonho em que sou sempre forte
para ao acordar
aceitar
a minha fragilidade
um sonho em que sussurro
adeus
sem esperar
um até já
as pessoas
da terra onde as bebidas são todas
gratuitas
e onde trazem canapés
em travessas douradas,
todas essas pessoas
abastadas,
bonitas,
novas
e as novamente bonitas;
deviam deitar-se,
adormecer
e acordar
para um novo sonho.
quero um sonho em que amo
apenas
o suficiente
e
em que tudo
é gratuito
começando
pelo teu
sorriso.