"Saudade do Burro Branco"
O burro branco já não aparece
e eu sinto a falta
da sua lentidão
na poeira seca,
do som das patas
no chão
no chão
como um aviso.
Fiquei bravo
Fiquei bravo
quando o conheci
ferido
porque logo ali
o amei;
e o que amo
quero proteger
até
com retroativos.
Ele não sabia o meu nome,
nem dos meus pensamentos
que, como ele, se arrastavam
tentando entender isso de viver
nem dos meus pensamentos
que, como ele, se arrastavam
tentando entender isso de viver
num misto de esperança e receio
de não saber abrir mão
do trauma.
O burro branco sabia de fome,
de suar até as vísceras saírem,
e eu, sem rumo,
com a falta do olhar simples
no fim da tarde quente.
O burro branco sabia de fome,
de suar até as vísceras saírem,
e eu, sem rumo,
com a falta do olhar simples
no fim da tarde quente.
Digo-me "teve de ser"
ouço os "é o que é":
uma bebida amarga
uma bebida amarga
que bebo na esperança
de não sentir a saudade
dessa alma quadrada
que nunca soube o meu nome
mas que sabia que a vida é dura
e que, numa qualquer encruzilhada,
dessa alma quadrada
que nunca soube o meu nome
mas que sabia que a vida é dura
e que, numa qualquer encruzilhada,
homem e um burro
se podem entender.
Não está;
e a saudade engole-me novamente,
como se eu fosse ele:
Não está;
e a saudade engole-me novamente,
como se eu fosse ele:
a contar cicatrizes;
a comer o resto de um qualquer dia
que por mais pormenorizada descrição
Só resta o silêncio
e a lembrança dos olhos,
reflexos de um cúmplice
a comer o resto de um qualquer dia
que por mais pormenorizada descrição
será incompreensível
para qualquer outro.
Só resta o silêncio
e a lembrança dos olhos,
reflexos de um cúmplice
cansaço.
Sem comentários:
Enviar um comentário