17/09/25

"as crianças não fazem barulho" // Pram


 "as crianças não fazem barulho"

(Palestina 2025)

o ecrã brilha
com um tipo de luz
que não aquece,
mas queima devagar.

fazemos scroll 
enquanto um corpo pequeno
é retirado dos escombros 
como se fosse 
um saco de arroz estragado.

vendem medo
em brilhantes embalagens
com música épica de fundo.

milhares de partilhas.
milhões de olhos.
nenhuma lágrima.

há dinheiro a ser contado
enquanto os ossos partem,
há contratos assinados
por mãos
que nunca 
empunharam uma pá
para enterrar ninguém,
mas que desenham mapas
com sangue.

as pessoas dizem
"é muito complicado"
e depois voltam à pizza,
à série,
ao sofá.

sem ninguém para varrer,
os corpos acumulam-se
como folhas de outono.

há, no entanto, coisas 
que não conseguiram matar:
o olhar
pequeno, sujo, faminto,
que ainda acredita.

uma mão que se estende 
quando tudo ensina 
a fechar o punho.

mesmo entre ruínas,  
a esperança é teimosa.
às vezes disfarçada de loucura,
ou de poesia mal escrita.

está viva.
e um dia vai gritar 
mais alto que todas as bombas!

Ouçam o que vos digo!
Falo do que sei.

A esperança é teimosa!


15/09/25

"fim de tarde" // John Adams // "repetição" // and also the trees

"fim de tarde"


os candeeiros 
               acordam 
o relógio derrete sobre a pele do rio
e os pássaros 
                tropeçam no silêncio

no entardecer 

desfaz-se o nome das ruas

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 "repetição"



tentamos 
justificar a repetição.

promessas não enchem bolsos.
o café já não funciona.
as máquinas estão cheias de ferrugem 

cada reunião 
apaga-me 
um pouco mais 
o nome.

tiro o lápis da boca, 
desenho a saída no chão